sábado, 5 de maio de 2007

Sobre árvores cortadas

Os posts anteriores fazem-me lembrar que nos meus livros também aparecem árvores cortadas. Normalmente a mando de autarcas. No primeiro («Quando o Presidente da República Visitou Monchique por Mera Curiosidade», publicado em 1996) há um conto chamado «A Costureira, o Raposo, o Pisco e o Plátano». A certa altura pode ler-se…
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Um dos plátanos de Santa Clara foi deitado abaixo, cortaram-no e venderam a madeira para a serração. A junta de freguesia precisou de abrir um caminho e o raio da árvore tinha logo nascido naquele sítio. Talvez já tivesse uns cem ou duzentos anos, ou até mais do que isso. Quanto aos irmãos do plátano, não os cortaram, tiveram mais sorte, nasceram em melhor sítio.
– Às vezes é logo ao nascer que se fica com o destino irremediavelmente marcado.
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E mais adiante…
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O plátano que cortaram em Santa Clara apareceu três dias depois no mesmo sítio, com as folhas bem verdes e a dar boa sombra. Na serração ninguém dava com a madeira, tanto que muita gente achava que havia mão de bruxa no assunto. Restava saber de que bruxa, porque a fama de várias mulheres das redondezas para as artes do oculto era muito grande. Podia ser obra de qualquer uma delas, podia até ser obra de todas ao mesmo tempo.
O presidente da junta dizia que nunca tinha pensado que as bruxas pudessem estar de sentido virado para a ecologia, ou melhor, falava-se que ele se tinha saído com essa. E também se falava que a princípio ele não tinha querido acreditar que o plátano tivesse aparecido no sítio de onde o tinham cortado, que tinha dito que o mais certo era tudo não passar de mais uma das histórias do Raposo do Besteiro. Só que não era, o plátano estava de novo no sítio onde nascera e ganhara corpo de árvore.
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