terça-feira, 8 de agosto de 2006

Ainda José Peseiro

A propósito da referência a José Peseiro no post anterior, deixo aqui um trabalho publicado na revista que dirijo («Pessoal»), em Novembro do ano passado, sobre o treinador que durante mais de uma época tinha estado no Sporting. A «Pessoal» é uma revista mensal da área da gestão, dedicando uma atenção especial à gestão das pessoas nas organizações. O trabalho levou como título global «A liderança de José Peseiro no Sporting».
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Primeiro, um texto de enquadramento escrito pelo jornalista Humberto Simões e intitulado «Chefe mas pouco».
Chefe mas pouco [Texto de Novembro de 2005]
»»» Depois de iniciar a segunda época ao serviço do Sporting, José Peseiro saiu à sétima jornada. O ex-técnico leonino alegou falta de condições. Foi um reinado pautado por alguns casos de indisciplina. Falta de liderança? Também.
»»» Quando José Peseiro foi contratado para treinador da equipa principal do Sporting, no início da época de 2004/ 2005, muitos adeptos leoninos mostraram-se agradados; como acontece em tantos outros clubes portugueses, viam num técnico relativamente jovem uma possibilidade de ter sido encontrado um novo José Mourinho. A temporada até nem começou bem – a equipa verde e branca chegou a ter oito pontos de atraso para o líder, o Benfica –, mas depois os leões acabaram por aproximar-se da liderança, sendo considerados pela maioria da crítica como a formação da Superliga que melhor futebol praticava em Portugal.
Todavia, o Sporting nunca chegou a atingir o lugar cimeiro. Sempre que essa oportunidade surgia, a equipa não conseguia vencer. Acusava em demasia o facto de puder saltar para o topo da tabela. E acabou por falhar em todos – mesmo todos – os momentos mais importantes e decisivos da temporada. Veja-se os jogos frente ao Benfica, na Taça de Portugal e na penúltima jornada do campeonato, e ao CSKA de Moscovo, na final da Taça UEFA.
Quanto aos jogos com o Benfica, se por um lado a eliminação da Taça de Portugal surgiu numa partida electrizante, só decidida após a marcação de grandes penalidades, já o encontro relativo à Superliga foi muito diferente. O Sporting não podia perder por uma bola a zero e acabou por cair vergado exactamente perante esse mesmo resultado. Peseiro alterou a habitual táctica, preferindo uma toada de contenção e esperar pelos erros do adversário, explorando o contra-ataque. Acabaria por revelar-se uma má opção. Mas será que se o treinador sportinguista fosse à Luz jogar de igual para igual venceria a partida? Não se sabe, mas provavelmente nesta altura não estaria a ser relembrado como o técnico que foi jogar para o empate. Com algumas cautelas.
Como um mal nunca vem só, quatro dias depois, os leões perderam a final da Taça UEFA, na sua própria casa. Mesmo depois de estar a vencer por 1-0, a equipa de Peseiro não conseguiu gerir a vantagem na segunda parte, acabando por sofrer três golos. Dias depois, frente ao Nacional da Madeira, na despedida do campeonato, em casa, mais uma derrota, humilhante e com actos de indisciplina à mistura.
Principais problemas
No reinado de José Peseiro em Alvalade, o treinador falhou em dois factores fundamentais: motivação e liderança. O ex-técnico leonino nunca adoptou um discurso incisivo, que motivasse jogadores e massa associativa. Sempre muito «redondo» quando os resultados eram negativos, aparecia nas conferências de imprensa numa toada mais de pedido de desculpas. As suas palavras nunca foram demasiado fortes para mexer com o grupo de trabalho. E quase sempre surgia a frase: «Estamos a passar por um mau momento…» Por outro lado, sempre que surgiram problemas com jogadores (ver caixa1, a seguir), nunca se notou pulso firme em relação às mediadas tomadas. E alguns atletas até foram reincidentes.
No entanto, será demasiado injusto colocar todas as culpas em cima de José Peseiro. O ex-treinador do Sporting pagou também a falta de liderança da direcção leonina. Já esta época, e depois da saída de Carlos Freitas – que fazia a ligação entre a sociedade anónima desportiva (SAD) e o plantel –, ninguém apareceu a dar a cara nos momentos difíceis. Pior, na derrota humilhante em Paços de Ferreira, Paulo de Andrade e Rui Meireles, administradores da SAD, abandonaram o estádio antes de a partida terminar. Peseiro ficou órfão e acabaria por cair. Naturalmente.
Factores de liderança
Manuel Sérgio, que foi professor de José Peseiro, afirmou que,possivelmente, o seu antigo aluno falhou na liderança. «Nunca o vi treinar, mas por aquilo que me diziam havia jogadores que lhe faltavam ao respeito,e isso matou-o. Se um técnico é insultado por algum elemento do plantel,nessa altura os outros também lhe perdem o respeito.» Já Carlos Manuel,que há alguns anos orientou a formação de Alvalade, salienta que «numa equipa de futebol o que se diz que é falta de liderança do treinador pode não o ser. Há também a liderança que é feita da parte de cima.» Continua: «Se nãohouver liderança da direcção, não há nenhum treinador que consiga resistir, eisso reflecte-se no próprio subconsciente dos jogadores. A estrutura tem grande relevo e, se calhar, foi isso que aconteceu no Sporting.»
Cada treinador tem a sua forma de liderar. Manuel Sérgio refere que «é necessário ter força psicológica, prestígio junto dos jogadores, ser corajoso e, ao mesmo tempo, é necessário que os atletas olhem para um treinador e lhe reconheçam valor. E para isso nem é preciso já ter um nome. Mourinho não o tinha e impôs-se. Mas ele para a profissão é um génio.» E acrescenta: «Hoje em dia, o treino é globalmente mais humano do que físico. O treinador deve ser inteligente e ter uma certa cultura, porque nada acontece por acaso.» Por último, este professor universitário assinala um dos factores mais importantes: a motivação. «E não basta saber motivar apenas os jogadores, há que fazê-lo também com os dirigentes e o público.»
Carlos Manuel, que presentemente se encontra desempregado, aponta como qualidades fundamentais para um técnico ter o grupo de trabalho na mão, a confiança, a qualidade do seu trabalho, a frontalidade, a personalidade, o orgulho e a comunicação. «Esta última talvez seja uma das mais importantes. A partir daí, pode-se desenvolver outras características adjacentes. Cada um é líder. Agora uns conseguem transmitir essa liderança com uma personalidade mais forte e mais vincada», termina.
CAIXA1 - Actos de indisciplina
- Decorria a primeira volta da época 2004/ 2005 e o Sporting deslocou-se a Setúbal para enfrentar o Vitória local. No início da segunda parte, José Peseiro resolveu substituir Tinga e o jogador fez questão de demonstrar o seu descontentamento. O atleta brasileiro foi multado pela direcção leonina mas integrou a convocatória seguinte. Foi a primeira situação em que um elemento do grupo de trabalho chocou com o técnico. Tinga viria a ser transferido para o Internacional de Porto Alegre, do Brasil, na reabertura do mercado de transferências, em Janeiro. Um ano e meio depois de chegar a Alvalade.
- A época natalícia de 2004 também foi madrasta para José Peseiro. Já vem sendo hábito os jogadores brasileiros que jogam em Portugal irem passar o Natal em família, no seu país. Também vulgar é o facto de esses atletas se atrasarem, chagando bem mais tarde do que o estipulado pelos clubes. Liedson foi o exemplo mais gritante no plantel leonino. O «levezinho» aterrou em Lisboa alguns dias depois do previsto e foi castigado pela direcção do Sporting. Em vésperas de um
derby lisboeta, mesmo assim Peseiro fez alinhar o avançado de início, e este até viria a marcar os dois golos da vitória (2-1) frente ao Benfica. Sem dúvida, um facto importante para esta opção não ter outras repercussões.
- No FC Porto – Sporting da época passada, em pleno Estádio do Dragão, os verde e brancos foram copiosamente derrotados por 3-0. Pior do que o desaire foi mais um acto de indisciplina de um jogador leonino. Fábio Rochemback não gostou de ser substituído e brindou José Peseiro com um «vai tomar no c...»; as câmaras da televisão mostraram perfeitamente os movimentos dos lábios do internacional brasileiro, mas o assunto foi desvalorizado internamente.
- O final da época transacta foi tudo menos pacífico no covil do leão. Na última jornada, Anderson Polga recusou-se a jogar contra o Nacional da Madeira. O jogador ficou chateado por, alguns dias antes, não ter jogado a final da Taça UEFA frente ao CSKA de Moscovo e alegou que não tinha condições psicológicas para iniciar essa partida. O Sporting acabaria por perder por 4-2 e não conseguir o apuramento directo para a Liga dos Campeões.
- A temporada de 2005/ 2006 parecia calma mas, alguns dias antes do início da Liga, Anderson Polga voltou a desentender-se com Peseiro, desta vez durante um treino. A derrota com a Udinese e o consequente afastamento da Liga dos Campeões deixou um ambiente tenso. A ousadia do brasileiro custou-lhe o afastamento da convocatória na primeira jornada. Todavia, o Sporting bateu o Belenenses (2-1).
- Já este ano, Liedson voltou a «desenterrar» a expressão celebrizada por Rochemback, no Estádio do Dragão. O Sporting recebia e vencia o Vitória de Setúbal (1-0). Com um elemento a mais, Peseiro decidiu trocar o goleador pelo defesa Beto. Esta alteração valeu ao técnico mais um «Vai tomar no c...» do avançado e algumas centenas de lenços brancos agitados nas bancadas. O jogo terminaria com a diferença mínima.
- Sexta-feira. Com os plantéis com muitas baixas, devido aos compromissos das selecções nacionais, Beto e Custódio resolvem animar um treino do Sporting. Depois de uma discussão sobre um fora-de-jogo, o central deu um soco no companheiro. Custódio ainda ameaçou abandonar o clube, houve várias reuniões entre os atletas e a direcção mas a verdade é que ambos jogaram na jornada seguinte, na derrota (1-0) frente à Académica de Coimbra. Beto, inclusive, ostentou a braçadeira de capitão de equipa.
CAIXA2 - Sete pecados mortais
14 de Maio de 2005: Benfica – Sporting
Com a derrota em casa do Benfica (1-0), os leões ficam definitivamente afastados da luta pelo título.
18 de Maio de 2005: Sporting – CSKA de Moscovo
A jogar em casa, a equipa verde e branca não conseguiu segurar a vantagem de um golo, acabando por sofrer três.
23 de Agosto de 2005: Udinese – Sporting
Após a derrota (0-1) em Alvalade, um novo desaire (3-2) custa aos leões apresença na Liga dos Campeões.
19 de Setembro de 2005: Nacional – Sporting
Com três vitórias em outros tantos jogos na Liga Portuguesa, a derrota (2-1) naMadeira quebrou a boa campanha leonina.
29 de Setembro de 2005: Sporting – Halmstads
A estreia na Taça UEFA até tinha começado bem com a vitória (2-1) naSuécia, frente a uma equipa bem modesta. Na segunda mão, em sua própria casa, os leões acabaram por ser eliminados.
02 de Outubro de 2005: Paços de Ferreira – Sporting
Esta deslocação ao Norte era a possibilidade de a equipa de Alvalade dar umpontapé na crise. Perdeu por 3-0.
16 de Outubro de 2005: Sporting – Académica
Num clima de enorme tensão, a formação leonina ressentiu-se e sofreu mais uma derrota caseira (0-1). E podiam ter sido mais.
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Um outro texto, desta vez de Jorge Araújo, managing partner da Team Work Consultores (foi treinador profissional de basquetebol durante quase quatro décadas, várias vezes campeão nacional; foi seleccionador nacional e considerado várias vezes «treinador do ano»; tem vários livros publicados, sobre temas ligados à liderança e à direcção de equipas).
O trabalho de José Peseiro visto por Jorge Araújo [Texto de Novembro de 2005]
A análise ao trabalho de um líder, seja ele quem for, deve ser o mais objectiva possível. Não é propriamente um assunto onde ajude muito especular ou opinar. No caso concreto, para o qual solicitam a minha opinião, devo limitar-me aos factos. Quais os objectivos que o líder em análise apontou e que resultados obteve? Sobre estas questões, não existem margem para dúvidas. É por demais evidente a respectiva desproporção em termos negativos. No alto rendimento não é justificação afirmar «jogámos bem, mas perdemos». Há objectivos que se alcançam, ou não, por via dos resultados que se obtêm. Para além disso, cumpre ao líder de uma equipa de alto rendimento ter uma visão inspiradora e mobilizadora, capaz de envolver no sonho colectivo todos aqueles que trabalham consigo. Lembram-se de José Mourinho quando chegou ao Futebol Clube do Porto? «Para o ano seremos campeões!» Contra tudo e todos, foi diferente, foi audaz e ambicioso. E aí fez desde logo a diferença. A um líder pertence apontar objectivos mensuráveis e, como dizem os norte-americanos, ter achievement quanto baste, que aponte para objectivos que em si mesmo representem uma enorme ambição, obviamente possível de ser concretizada. Mas não só.
A um líder pertence a responsabilidade de, por via das suas intervenções, conseguir alterar atitudes e comportamentos daqueles que consigo trabalham, complementando objectivos individuais e colectivos, gerindo ambições e expectativas, fomentando trabalho em equipa e identificação colectiva. Conseguindo que a sua autoridade seja mais reconhecida do que imposta. Será que no que podemos perceber do exterior relativamente à equipa profissional de futebol do Sporting é possível detectar que tais sinais existem? Poucos, mesmo muito poucos. Ser competente, hoje em dia, seja para treinadores, seja para gestores de empresas, requer competências que transcendem largamente o âmbito meramente técnico. A área comportamental mostra-se hoje com uma transcendente importância em tudo o que à liderança diga respeito. Ora, muito dos problemas que transparecem para o exterior da realidade leonina têm acima de tudo a ver com questões de comportamentos e atitudes. Elucidativo, portanto.
Mas gostaria, igualmente, de deixar bem claro que tal não significa, em definitivo, qualquer avaliação definitiva ao treinador em questão. Tão só que, perante aquelas circunstâncias e aquele contexto, ele não foi capaz de encontrar as soluções necessárias para os problemas com que se deparou. O que nos transporta para uma outra área muito importante também. A da cultura das organizações e suas respectivas influências, em termos de potenciarem ou (demasiadas vezes) prejudicarem de modo declarado o rendimento possível das equipas de alto rendimento nelas existentes. E veja-se este simples sinal. Na organização a que pertencia o treinador que agora todos acusam e procuram apontar como o «bode expiatório» do que se está a passar é ainda possível que as claques tenham a possibilidade de questionar directamente o treinador acerca dos resultados e exigir-lhe melhores resultados. Está tudo dito.

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Mais um texto, de Arménio Rego, doutorado em Organização e Gestão de Empresas, professor na Universidade de Aveiro (de entre as suas várias áreas de interesse, destaca-se a que diz respeito aos temas da liderança; é autor de vários livros relacionados com as suas áreas de interesse).
Onze reflexões sobre José Peseiro e o trabalho dos treinadores, por Arménio Rego [Texto de Novembro de 2005]
1. As complexas ocorrências que o Sporting tem vindo a experimentar não se compadecem com interpretações simples. Há uma multiplicidade de factores que podem explicar o que foi ocorrendo – mas dificilmente se consegue encontrar a «solução» que «poderia» ter evitado os fracos resultados da equipa. Todavia, há um factor nem sempre considerado, mas cujo papel é determinante: o futebol é, em grande medida, um jogo de soma nula: para que uma equipa vença, a outra tem que perder. Mais prosaicamente, isto significa que nem todos os treinadores brilhantes podem obter os bons resultados.
2. Sobre José Peseiro já foram tecidos os melhores encómios – e já foram elaborados os argumentos mais reprovadores. Esta é uma tendência bastante frequente – o mesmo profissional é alvo de avaliações antagónicas. Por regra, o treinador é considerado excelente quando os resultados são positivos – e considerado menos bom quando os resultados são negativos. Daqui decorre uma interessante embora provocatória «tese»: não é o líder eficaz que gera bons resultados, são os resultados eficazes que induzem os seguidores a considerarem que o líder é eficaz.
3. Não parece também haver dúvidas de que os resultados desportivos de uma equipa de futebol dependem da interacção entre múltiplos factores (designadamente: jogadores, treinador, adeptos, equipa dirigente, adversários). Por conseguinte, a imputação ao treinador da responsabilidade dos resultados é, em certa medida, «romanceada».
4. Pese embora o que foi aduzido, ressalve-se que seria pouco curial considerar que o papel do treinador é escasso. Na verdade, parece mais razoável e sensato supor que ele pode exercer um papel relevante nos resultados da equipa. E um dos mecanismos que mais contribui para que isso aconteça é, precisamente, a expectativa de que o seu papel é fundamental. As reflexões seguintes permitem compreender como isso ocorre.
5. Quando a equipa de um dado treinador começa a revelar fracos resultados, é provável que, progressivamente, lhe sejam atribuídas responsabilidades pelo fracasso. Quando o insucesso se renova, o pessimismo pode tomar conta da equipa. Daí pode decorrer, progressivamente, menor empenhamento e dedicação dos jogadores. E é precisamente por essa razão que a probabilidade de fracos resultados é maior. Ou seja, a fraca expectativa projectada sobre o treinador acaba por resultar em fraco desempenho, de tal modo que «a profecia acaba por transformar-se em realidade»: «Afinal, nós tínhamos razão – ele é realmente fraco treinador».
6. Suponhamos que o novo treinador da equipa é, em termos objectivos (admitindo que tal é possível!), do mesmo calibre de José Peseiro. Admitamos que ambos são igualmente competentes e poderiam alcançar bons resultados. Mas o novo treinador emerge – aos olhos dos jogadores, da equipa dirigente e dos adeptos – como o «salvador» que subtrai a equipa da adversidade e a coloca na senda do sucesso. Os jogadores empenham-se, então. A equipa dirigente faculta as condições de que o novo treinador necessita. E o contágio dos adeptos transmite-se prolixamente aos jogadores, ao treinador, à comunicação social e à equipa dirigente. Os bons resultados começam então a surgir. Em suma: é precisamente porque a expectativa é elevada que os vários agentes respondem com empenhamento e entrega, e que os resultados desportivos melhoram.
7. Como a realidade demonstra à saciedade, o que antes expus não pretende ser uma tendência explicativa segura. O que importa compreender é o seguinte: (a) a eficácia dos treinadores é uma matéria complexa; (b) o desempenho das equipas depende, fortemente, de expectativas e de um «capital desportivo-relacional» que engloba aspectos racionais e irracionais, expectativas e realidades já encontradas, estilos que ora resultam ora fracassam.
8. É interessante verificar que José Peseiro foi considerado, diversas vezes, um excelente treinador. E alcançou alguns bons resultados. Então, quais as razões pelas quais alguns rotundos fracassos ocorreram, designadamente em momentos-chave? A resposta estará seguramente na multiplicidade de factores e de entidades em jogo. Mas, no que concerne ao treinador propriamente dito, aventuro-me numa explicação que alguns dados científicos sugerem: os líderes mais inteligentes, perante situações muito stressantes, têm mais dificuldades no processamento da informação, de tal modo que a sua inteligência é menos útil e/ ou pode mesmo ser contraproducente; por isso, alguma literatura sugere que a inteligência dos líderes pode contribuir para o sucesso em momentos de menos ‘stress’, ao passo que a experiência pode ser mais relevante em momentos de maior ‘stress’.
9. Num debate televisivo recente, um comentador referia: «José Peseiro é um bom treinador – falta saber se o é para o Sporting». Esta tese encerra uma ideia crucial: a liderança eficaz é um processo de influência recíproca, e não o atributo de um treinador. Um líder/ treinador pode ser eficaz numa dada equipa ou num determinado momento de uma equipa – mas poderá não sê-lo noutra equipa, ou na mesma equipa em momentos diferentes.
10. Os líderes/ treinadores são realmente importantes. Mas não podemos menosprezar outros elementos do processo. O que sucede é que é mais fácil (ou apenas possível) mudar o treinador do que modificar a diversidade das situações que envolvem uma equipa. Ademais, é confortável supor que, mudando o líder, conseguimos mudar o rumo dos acontecimentos. Mas a realidade não é necessariamente esta.
11. A liderança de José Peseiro não pode ser interpretada apenas à luz dos comportamentos e das características de José Peseiro. Se queremos compreender o que realmente ocorreu, cabe-nos identificar o resultado da mistura explosiva que abrange ambições, desejos, equívocos, dissonância de estilos, comportamentos das outras equipas, pressões, invejas, relações humanas, valores pessoais, cultura de clube, conflitos de personalidades, acções dos meios de comunicação social, expectativas, medos e emoções. É difícil – mas parece real.

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